terça-feira, 26 de março de 2013

Trocando Ideia! | Fernando Cobra: Meio homem, Meio Máquina, Inteiro Coração

Abertura

  Confiante de que os limites do ser humano são estabelecidos pela mente, e não pelo corpo, Fernando Cobra optou por vencer mais desafios do que sua condição física parecia permitir. Conheça um pouco da história de um skatista como você. "Deficiente é aquele que não consegue modificar sua vida, aceitando as imposições de outras pessoas ou da sociedade em que vive, sem ter consciência de que é dono do seu destino" (Mario Quintana).

Fernando Cobra, bs grind no bowl do Clube Pinheiros, em São Paulo (foto: Eduardo Braz)


  Uma viagem para a Califórnia. No caminho, 20 pistas devidamente identificadas e mapeadas num roteiro pouco usual para um casal em lua de mel. Foi assim que Fernando Cobra e sua esposa Angélica comemoraram sua união, ocorrida em 2007. Cruzando todo o estado norteamericano, e contando com os registros em foto e vídeo da esposa, Fernando realizou seu sonho, não por acaso o de dez entre dez skatistas. “Vejo muita gente que tem objetivos, da boca pra fora. Você só consegue o que quer se vier do seu coração. E as minhas vontades vêm do coração”, afirma. Por razões que a medicina jamais soube precisar absolutamente, Cobra nasceu sem a perna direita (do joelho para baixo). Reflexo de um parto bastante complicado, as cerca de 48h que sua mãe foi obrigada a esperar pela notícia do filho a fizeram ver o problema como uma coisa menor. “Minha mãe achava que eu tinha morrido. Quando soube que ‘só’ faltava meia perna, ela ficou aliviada.” Segundo ele, “a maneira com que minha família lidou com a situação foi fundamental. Aprendi a engatinhar já com uma prótese, nunca ninguém ficou me tratando diferente, ou facilitando as coisas pra mim”.

   Desde que começou a ter noção de sua limitação física, jamais imaginou que isso poderia ser um empecilho para qualquer um de seus objetivos. Talvez uma dificuldade, uma adaptação a mais, mas nada que o impossibilitasse. Prova viva de sua própria determinação, Cobra praticou triatlo durante muitos anos, sendo o responsável pela criação (por parte da confederação que regulamenta esta prática) da categoria “amputados”, algo que julga essencial que exista em todas as atividades. “O deficiente, não só praticante, mas também simpatizante do esporte, sente-se incluído ao saber que determinada competição terá uma categoria para ele”, defende. A disciplina necessária para competir como triatleta não se encaixava mais na agenda de Cobra, que teve que abandonar o triatlo competitivo. O destaque obtido, além dos cerca de quinze troféus, infelizmente, não gerava condições de sustentar-se pelo esporte. “No dia da competição, diretores de empresas me abraçavam, me davam os parabéns, pediam para eu visitá-los. Na segunda-feira, quando chegava nas empresas, pareciam outras pessoas: me atendiam mal, ofereciam duas camisetas e ainda queriam que eu participasse de jantares, eventos que nada tinham a ver com esporte.” Estava aberto o caminho para a retomada de uma outra paixão, com horários flexíveis e regras quase inexistentes: o skate.


Fernando Cobra, na rua de sua casa na Vila Madalena, em São Paulo (foto: Eduardo Braz)


  “Comecei com o Torlay, com seis ou sete anos”, recorda. Mais tarde, conheceu as curvas do banks do QG Skatepark, em Pinheiros, e a ladeira da Circular do Bosque, no Morumbi. “Nessa época, usava uma prótese que restringia muito o movimento”, explica. A evolução tecnológica dos materiais usados na fabricação da perna mecânica propiciam hoje um skate ilimitado e, consequentemente, muito mais divertido. Os banks das pistas públicas da Imigrantes e do Sumaré, ambas na capital paulista, têm sido o terreno preferido de Cobra, além do clube Pinheiros. “O dia que subi no tapume pra ver qual era a nova obra no clube e descobri que estavam fazendo um banks, fiquei alucinado. A partir daí, o skate voltou com tudo a fazer parte de minha vida.”

   Cobra, inquieto assumido, trabalha no mercado de derivativos e futuros, a BM&F. No ritmo alucinante do mercado financeiro, muitas vezes se pega almoçando diante do computador, de olho numa oportunidade de negócio que simplesmente não vai esperar. “Amo isso” afirma Cobra – “preciso dessa adrenalina, dessa concentração absoluta”. Um dos benefícios de ser meio homem, meio máquina é a mistura entre preparação física e manutenção. “Às vezes, volto da sessão com alguma avaria na perna mecânica. No dia seguinte, chego ao trabalho, mando pelo motoboy para o conserto e, no final do dia, me trazem ela de volta, novinha!”

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